domingo, 22 de novembro de 2009

ASSASSINATOS NO ESTÚDIO C - CAPÍTULO 1

É domingo. Típico domingo chuvoso em São Paulo, ruas quase vazias, tédio estampado no rosto das pessoas. Em um apartamento no 23° andar do Flat La Genoveva, localizado nas imediações dos Jardins, o detetive Clayton dorme em sono profundo. Passara a noite anterior em claro, trabalhando em uma operação denominada Urubu Tem Rabo, cujo objetivo foi o fechamento das casas de prostituição da Baixa Augusta. O nome da operação, um tanto estranho para alguns, foi escolhido pelos integrantes de sua equipe do 399° DP.

- Uma homenagem às putas, todas horrorosas, mas com bundas de encher os olhos, disse o Detetive Steves, Steves assim mesmo, sem o E inicial. Não que ele gostasse das bundas das putas, pois normalmente ele se satisfazia com os pintos dos putos, mas como não queria compartilhar suas preferências com seus colegas, dizia coisas que todo enrustido diz, mas que quase ninguém acredita.

Mas voltemos ao Detetive Clayton. Passava do meio-dia quando ele retornou para seu flat. Quem o conhece, sabe que é um policial de coração mole. E como tal, passou a manhã tentanto encontrar abrigo para quatro prostitutas que ficaram sem casa para morar. Duas ele deixou na casa da Dona Vitória, velha cafetina muito conhecida da polícia por oferecer noites gratuitas de prazer aos defensores da lei em troca do silêncio e da manutenção de sua atividade profissional.

A terceira ele deixou na casa de Amelinha, sua tia avó de 88 anos, cega e surda, que insistia em morar sozinha. Sozinha propriamente não, já que ela tinha um cão guia que a acompanhava por todos os lugares e uma diarista que fazia os serviços domésticos todas às sextas-feiras. Para a tia, ele disse se tratar de uma amiga que perdera o emprego e fora despejada. Nenhuma mentira. Para a moça, pediu apenas que ela não fizesse programas no dia da diarista.

- Nos demais dias não haverá problema, pois a tia Amelinha não enxerga e não escuta nada mesmo”, ressaltou antes de ir embora.

Contei tudo isso para chegar na quarta moça, a Dinalva, mais conhecida na noite por Sheila . Com cabelos longos quase loiros, olhos azuis quase hipnotizantes, seios quase naturais, bunda quase na medida exata e uma voz triste, que de triste não tinha nada pois ela sabia enganar muito bem, Sheila conquistara o detetive. Ele a convidou para ir ao seu Flat, ela aceitou, mas antes pediu que ele lhe pagasse um café, pois estava com muita fome. E foi lá na Galeria dos Pães, na Rua Estados Unidos, que eles conversaram e ela lhe disse que seu grande sonho era ser uma dançarina de programa de auditório.

Essa revelação conquistou-o definitivamente. Viu nesse desejo uma pureza, uma ingenuidade, uma paquita que poderia ter sido mas não foi e que este fato, aliado à outras desgraças pessoais, a levou à prostituição, o que o deixou profundamente comovido.

Mas como agora o que eles conversaram não interessa – talvez venha a interessar um pouco mais adiante – vou resumir os fatos. Ele pagou a conta, eles foram para o flat, ela deu para ele, ele acendeu um cigarro depois, ela foi para o banho, ele ligou a TV e dormiu. Dormiu tão intensamente que não percebeu quando Sheila foi embora depois de recolher uma boa quantia em dinheiro de sua carteira. Nem tampouco ouviu o início do Programa Domingo de Tarde, típico programa de auditório exibido diretamente do estúdio C pela TV Mundo, líder de audiência no horário.

Há dez anos no ar, o Domingo de Tarde não é nada diferente do que os seus concorrentes. Possui quadros melodramáticos, calouros desafinados, atrações que podem ser vistas em qualquer rua do centro da cidade e, claro, dançarinas ao fundo fazendo coreografias que mais parecem rituais de ovulação e fecundidade. E exatamente às 15h13, Franciele, a mais antiga dançarina do programa, conhecida como Mulher Tempero, colocou a mão em seu pescoço como se estivesse sem ar e foi ficando primeiro vermelha, depois azul, para terminar completamente roxa. Duda Maia, o apresentador, viu em seu monitor a cor da dançarina, reclamou no ar que a equipe de edição estava brincando com o novo equipamento de efeitos especiais comprado pela emissora, que isso não era possível, que se alguém quisesse brincar que não fosse no programa dele, o diretor começou a dar um esporro na frente do auditório, a dançarina do lado que tinha visto que a cor era de verdade e não de efeito tentou avisar mas por causa do susto a voz não saía, e foi no meio dessa confusão toda que Franciele caiu morta no chão. Neste exato instante, o Detetive Clayton roncou mais alto!

2 comentários:

Silvia Ferreira disse...

Sensacional como sempre!
Fã número 111111111
Não vejo a hora de ler o segundo capítulo!
Bjsssssss

franz keppler disse...

Valeu Silvoca. Aguarde até o próximo final de semana. Bjos