sexta-feira, 27 de março de 2009

HISTÓRIAS DE FAMÍLIA


Escrever a história do meu avô me fez lembrar de outras histórias de família.
Uma delas foi a da minha avó paterna, Elisa. Ela ficou viúva um pouco antes de eu nascer e desde então passou a morar com meus pais. Era viciada em loterias e na igreja.
Dizia ela – o que nunca acreditei – que assim que nasceu seu quarto e último filho, nunca mais teve relações sexuais com meu avô. Queria dedicar-se unicamente à igreja, onde ia quase que diariamente rezar e, possivelmente, conversar com outras amigas beatas sobre as últimas novidades do bairro. Certa vez ela ganhou na loteria e investiu todo o dinheiro ganho em sua candidatura à vereadora. Os votos foram tão poucos que logo ela se deu conta que nem as comadres da igreja haviam votado nela. Brigou com todas elas e foi rezar em outra paróquia.
Se ela realmente praticou a abstinência sexual, aos 80 anos o desejo sagradamente recolhido deu lugar a sonhos eróticos com o Ronnie Von – sim, ela nos contava isso - e lembranças de suas aventuras. Até onde sei, ela foi casada duas vezes e saiu virgem do primeiro casamento, pois o marido adoeceu logo após o matrimônio e morreu uma semana depois. “Em compensação, o seu avô, na noite de núpcias, me fez seis vezes”. Sim, ela também nos contava isso.
Diferentemente dela, minha tia Iara, irmã de minha avó por parte de mãe, era extremamente moralista. Não deixava meu tio ver televisão, pois nela só havia mulheres seminuas. Ele só podia ligar a TV diante de sua cerrada vigilância. Não escondia suas retrógradas opiniões de ninguém e fazia questão de dizer que as mulheres que usavam biquinis eram prostitutas, mesmo estando diante de suas sobrinhas que usavam biquinis. Nacionalista radical, só ouvia música sertaneja, que fazia questão de cantarolar quando eu, ainda criança, ia tomar lanches deliciosos em sua casa no Tremembé. Só depois que ela morreu, soube que seu verdadeiro nome era Ubalda, o que ela escondeu de todos nós. Com toda a razão.
Lembrei-me também do meu tio Bonifácio, que me fez comer rã pensando que era frango, do tio Mário, que morreu sem nenhuma lembrança de vida, da Tia Cora e sua invejável alegria de viver, do Tio Carlos, que casou-se com uma prostituta e depois caiu na bandidagem e do tio Otto, oficial da aeronática que perdia todo o seu dinheiro no jóquei. E em meio a todas estas lembranças, veio em minha mente a imagem de minha irmã Laura, com seus cabelos castanhos compridos e olhos azuis profundos. Vítima de fibrose cística, ela morreu aos 20 anos. Passou sua vida lutando contra a doença, mas quem a via pela primeira vez, sequer imaginava que ela sofria de algum mal, tamanha sua alegria e resignação. Um pouco antes, como que já sabendo que o inevitável se aproximava, quis terminar o namoro que já durava quase dois anos. Não queria ver o namorado sofrer mais do que ele já havia sofrido ao ver a vida terminando. Pedido negado. Ele ficou ao lado dela até o fim! Ainda passou um tempo visitando meus pais até que um dia foi seguir sua vida. Gostaria de saber por onde anda! Quem sabe um dia a gente não se encontre por aí e lembre, com uma saudade feliz, aqueles dias de namoro já tão distantes.

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